ANO NOVO E O ESTADO VELHO PETRALHA

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009


Lei Seca: E Quanto às Vítimas? Nada!

Por Klauber Cristofen Pires


Em certa ocasião, assistia a um telejornal, de onde obtive uma notícia bastante ilustrativa dos dias em que vivemos. A reportagem não trazia nada de exorbitante, qual seja a de um acidente entre dois veículos que foi provocado por um motorista bêbado, a não ser por um detalhe que a muitos deve ter passado despercebido: a vítima, um homem simples, cujo carro era usado e comprado à custa do sacrifício de anos de poupança, receava não receber a devida indenização...
Tenho que os repórteres quase chegaram ao cerne da questão que pretendo tratar aqui, mas, infelizmente, mais uma vez, passaram perto do tesouro, e seguiram sem se dar conta. Depois da promulgação da chamada Lei Seca, toda a atenção da mídia passou a se voltar às estatísticas dos sinistros; abundam as tomadas em que aparecem sujeitos “trêbados” como se eles nunca antes estivessem perambulando por aí nas ruas e estradas antes da entrada em vigor da nova lei.
Estou a questionar, se o leitor ainda não percebeu, o fato de a lei em comento ter simplesmente olvidado àqueles a quem qualquer ato normativo, por princípio, deveria ser endereçado: às vítimas! Sintoma claro de que o Estado já se enxerga como um fim em si. Ora, para que motivo se legislaria sobre o trânsito, se a rigor não for para o bem e a segurança das vítimas? Todavia, por acaso há algum artigo, inciso ou alínea que tenha contemplado uma só garantia para elas? Nada! O coitado do homem que teve o seu carro batido, na reportagem a que assisti que procure o bispo, ou trabalhe mais três anos para consertar o seu ou trocá-lo!
Toda a lei foi redigida para atender somente a interesses do Estado, sendo a expectativa de proteção aos cidadãos meramente incidental ou até mesmo puramente abstrata e fictícia. Pra começar, uma gorda multa de mais de novecentos reais para quem quer que tenha pelo menos ingerido um licor depois de um almoço, ou quiçá, um bombom com recheio de rum (Deve resultar em uma boa fonte de receita, não?). Multa, confisco da carteira, retenção do veículo, prisão...mas, sobre as vítimas, o quê? Poderiam, por exemplo, estabelecer uma multa reversível diretamente pra elas, como uma forma provisória de indenização, ou estabelecer privilégios processuais mínimos que pudessem garantir-lhes os reparos físicos, psicológicos e patrimoniais com celeridade. 

Quando alguém realiza uma importação qualquer, o estado logo garante a sua parte exigindo a permanência do bem em custódia ou emitindo um termo de responsabilidade auto-executável. Por que nunca se pensou em algo assim para os atingidos por colisões? Respondo aqui: por desinteresse! Por desprezo!
O Estado legisla sempre com base em estatísticas, a técnica que sempre visa a resolver o problema de uma maioria e silenciar à força a minoria (embora quase nunca logre os efeitos que pretende alcançar). É desta forma que o Estado se permite fechar bares, desde que com base em números demonstra que assim os crimes diminuem, ainda que a grossa maioria da população que os freqüenta seja ordeira e só deseje se divertir; ou que proíbe o fumo ou persegue fumantes, desde que com isto alegue gastar menos com o sistema público de saúde, ainda que muitos se utilizem de planos de saúde privados ou médicos particulares; ou que, para aproveitar que estamos a falar sobre trânsito, estipula a obrigação do uso do cinto de segurança, mandando às favas as pessoas que conseguem sobreviver a acidentes justamente por não o terem utilizado!
Outro caso bem característico foi o protagonizado pelo então ministro da saúde, José Serra. Com base em números, como se seres humanos fossem equações matemáticas, ele perseguia instituições de saúde para que os partos fossem realizados de forma natural. Agora imagine o leitor que um médico, pressionado por seus diretores, venha a propor a uma paciente que necessite do uso da cesariana para que ela opte pelo parto normal, mesmo correndo risco de vida, para atender assim à cota do mês! Quantas vezes isto não deve ter ocorrido, e justamente com as mulheres de condição mais humilde?
Os defensores da intervenção estatal que se escoram na teoria do crime de risco julgam que com base nela se evitam os malefícios causados por quem não sabe cuidar de sua liberdade com responsabilidade. Oras, mas a questão é justamente esta! Que responsabilidade? A que o próprio estado já havia subtraído a quem de direito?
Pois, em nosso estado, uma vítima paga pelos crimes de seu agressor pelo menos quatro vezes: em primeiro lugar, pelo que lhe foi roubado (que quase sempre nunca retorna integralmente); em segundo, para a busca e prisão do seu agressor; em terceiro, pelo seu julgamento, e por fim, para mantê-lo em uma prisão com direito a auxílio-reclusão para a família - dele (!) - e com direito a visitas íntimas!
Pois bem, todos estes custos, segundo a doutrina liberal, deveriam ser arcados pelo agressor! Se a sua busca e captura custou cinqüenta mil reais, que ele pague por isto trabalhando na cadeia, assim como também as custas judiciais, o retorno do butim, os reparos morais e psicológicos às vitimas, bem como os lucros cessantes caso existam, e até mesmo as suas refeições, a luz elétrica, e o colchão em que dorme. Um regime de liberdade só pode ser bem compreendido à luz da máxima responsabilidade.
A mídia anda alardeando uma diminuição de 20% sobre o número de acidentes, como se isto pudesse representar algum resultado aceitável. Oras, ainda restam 80% de pessoas que optaram por correr o risco, o que demonstra claramente que os indivíduos que se encontram nesta faixa absolutamente majoritária vislumbram a plena possibilidade de não terem de arcar com as conseqüências, ou que elas são relativamente brandas.
Enquanto isto, milhares ou milhões de brasileiros que bebem socialmente estão restringidos em sua liberdade, mesmo sem jamais um dia na vida terem sido causadores de colisões. Um casal trabalhador, pagador de impostos e respeitador das leis já não pode compartilhar uma taça de vinho em um restaurante, porque a multa de novecentos reais é absurdamente alta para eles (em relação ao passeio) ao mesmo tempo em que é irrisória perto do conserto de um carro batido (só a substituição de uma lanterna quebrada pode vir a custar mais de quinhentos reais).
Como se vê, a Lei Seca, assim como tantas outras que servem de pretexto para o Estado se intrometer nas liberdades humanas, é insuportavelmente amarga e pesadamente custosa para as pessoas cumpridoras da lei e que detém suficiente juízo individual para decidirem se podem pegar ou não em um volante, ao mesmo tempo em que pouco disfarça a eterna opção preferencial pelos transgressores, tratando-os sempre com doce candura quando alivia os seus ombros para colocar os pesos sobre suas vítimas.
Imagine quem seria tolo o suficiente para pegar as chaves, mesmo em estado de embriaguez, se antevisse não como uma remota possibilidade, mas como uma conseqüência praticamente certa, a obrigatoriedade de pagar, e dentro de um prazo de tempo exíguo, por todos os custos em que incorresse no caso de um sinistro: o reparo do automóvel (pense num modelo de luxo) os custos hospitalares e psicológicos, e até mesmo uma pensão vitalícia se o arrimo da família viesse a morrer, pela mesma renda mensal que ele percebia antes de ser morto! Não seria um fortíssimo desestímulo?

Fonte do artigo: http://libertatum.blogspot.com

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